A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) apresentou nesta segunda-feira um relatório preliminar sobre a situação dos direitos humanos no Brasil, após cumprir uma extensa agenda, que teve início no dia 5 de novembro.
Em coletiva de imprensa, em um hotel da Zona Sul do Rio, a relatora da Comissão, Antônia Noguera, ressaltou que a partir das visitas, foi possível observar um panorama atual do país.
Ela expressou a “profunda preocupação” com a situação dos direitos humanos no país, que será acompanhado de maneira prioritária pela entidade.
O relatório da Comissão Interamericana de Direitos Humanos traz 71 recomendações às autoridades brasileiras. Entre as questões que exigem solução urgente , o aumento no número de ataques sofridos por defensores de direitos humanos.
O texto trata especificamente do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, afirmando que o caso, ainda sem solução, evidencia um desafio estrutural e expõe a resistência de inserir pessoas historicamente marginalizadas nas estruturas de participação política.
Entre os desafios e riscos, a relatora destacou o “alarmante crescimento” de um ambiente que estigmatiza e distorce o papel dos direitos humanos na sociedade.
Também observou a repetição de discursos de intolerância e ódio que afetam a liberdade de expressão da população LGBT, das mulheres, dos afrodescendentes, povos indígenas e trabalhadores rurais.
As observações preliminares serão consolidadas em um relatório final, a ser publicado nos próximos meses.
Retrocessos
O relatório preliminar observa que o processo de fortalecimento institucional da área de direitos humanos no Brasil sofreu uma espécie de congelamento. Também alerta que problemas estruturais ainda persistem no país e precisam de solução.
“Apesar dos avanços, encontramos um país que não teve sucesso na abordagem de suas principais dívidas históricas com a cidadania: o problema estrutural de desigualdade e discriminações profundas, entre as quais se destacam a discriminação racial e social”, diz o texto da CIDH.
O documento reúne análises preliminares da delegação da CIDH sobre sua recente visita ao Brasil e expressa “preocupação com a situação dos direitos humanos no Brasil e seu futuro”. “A CIDH tristemente identificou uma redução da intensidade dessa dinâmica, com o congelamento do processo progressivo de fortalecimento institucional dos direitos humanos.”
Segundo o relatório, são observados “retrocessos significativos na implementação de programas, políticas públicas e na garantia de pressupostos em áreas essenciais”.
Referência
O texto lembra que há políticas adotadas no Brasil que são referência em direitos humanos, como a criação de uma secretaria específica para a área, o fortalecimento das defensorias públicas e o aumento de participação da sociedade civil na gestão pública, além de ações afirmativas como a Lei de Cotas.
Também foram elogiadas medidas mais recentes, como as audiências de custódia, a nova Lei de Imigração e a adoção da prisão domiciliar para gestantes, mães de filhos pequenos e de pessoas incapacitadas.
Urgência
O relatório menciona ainda medidas recentes de austeridade fiscal, apontando-as como um fator que “pode significar o fim de políticas sociais e a redução das expectativas de melhores condições de vida da grande maioria da população”.
A comissão destaca entre temas apontados como urgentes o respeito aos direitos dos povos indígenas, quilombolas, trabalhadores do campo e da população de rua. O relatório inclui ainda questões relativas à população carcerária, ao respeito aos direitos da população transexual e LGBT, dos defensores dos direitos humanos, dos imigrantes e a garantia da liberdade de expressão da imprensa, da academia e organizações sociais.
Ao lembrar a luta contra a corrupção, o relatório da CIDH afirma que esta também é uma forma de violação dos direitos humanos e que a indignação com a corrupção deve se estender às demais violações de direitos. O texto cita ainda a prioridade para o meio ambiente e defende a manutenção do Estatuto da Criança e do Adolescente. A comissão manifesta-se contra a redução da maioridade penal e alerta sobre a violência contra líderes urbanos e rurais. A morte da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Pedro Andrade, em março deste ano no Rio de Janeiro, é lembrada como um crime que aguarda solução.
O relatório faz ainda referência à violência contra camponeses em Marabá, no Pará, à forma como vivem os moradores da Cracolândia, em São Paulo, e ao desastre ambiental de Mariana, em Minas Gerais, que completou três anos neste mês.
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