Imagem: Marcello Casal Jr / Agência Brasil
Por Tiago Braz de Menezes
A liberdade durante muito tempo vem inscrevendo sujeitos sob a forma de indivíduos tendo, a analogia do pensamento Rousseauniano, o exercício da liberdade como soberania. Daí surge a dificuldade de viver em uma cidade pestilenta, visto que sua soberania o leva a crer que o respeito à um afastamento social que busca o bem coletivo é desnecessário.
Visão essa que se assemelha aquelas frases insculpidas na traseira do caminhão que vira e mexe aparece nas rodovias e costuma dizer: “como estou dirigindo? Mal? Dane-se, o caminhão é meu”. Essa lógica de que o caminhão é meu e faço o que quiser porque sou livre é o que faz a ideia de liberdade aproximar-se da ideia de idiótes. Afinal, ninguém é soberano.
Mas aí surge a questão, desinstitucionalizar não seria o ideal máximo de uma sociedade verdadeiramente livre? A resposta que ecoa comumente é que sim. Porém, aqui busca-se a ideia de desinstitucionalização distinta da sua versão liberal, que passe a reduzir a interferência nos costumes e família, ao mesmo tempo que fortalece a sensibilidade jurídica contra os processos de espoliação, ou seja: desinstitucionalizar onde é necessário desinstitucionalizar.
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Como ensina-nos Safatle um exemplo paradigmático é a desinstitucionalização do casamento, visto que caberia “ao Estado simplesmente deixar de legislar sobre a forma do matrimônio, limitando-se a legislar única e exclusivamente sobre as relações econômicas entre casais ou outras formas de agrupamentos afetivos”¹.
Assim torna-se evidente a necessidade da institucionalização da cidade pestilenta, não como meio de domínio sobre a liberdade humana, mas como conscientização de que precisamos todos, em certo sentido, de proteção para que seja possível o “desdobramento da liberdade dentro dos limites da coexistência”².
Afinal, viver é conviver, seja na cidade, fazenda ou prédio, visto que a vida humana pauta-se na coexistência com mundo ao seu redor e a liberdade nesses tempos de alastramento do coronavírus (COVID-19) não pode ser vista como autonomia, mas sim como heteronomia, ou seja: algo que age a sua revelia por necessidades biológicas e o informa que seu corpo não é soberano e precisa de cuidados e um distanciamento social mínimo para própria subsistência, na medida que és mortal e si encontra em um mundo cercado pela pestilência.
Tiago Braz de Menezes é formado em direito pela Faculdade Montes Belo.
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Notas:
[1] SAFATLE, Vladimir. O circuito dos afetos: corpos políticos, desamparo e o fim do indivíduo. 2º ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2018. p.250;
[2] FILHO, Roberto Lyra. O que é Direito. São Paulo: Brasiliense, 2012.