Fonte: Instituto Sou da Paz.
Armas de cano curto, como revólveres e pistolas, de calibre permitido e de fabricação nacional: este é o perfil das armas mais usadas na prática de crimes no Brasil. Outro dado relevante é o de que a grande maioria das armas apreendidas já esteve, em algum ponto de sua cadeia da produção à venda, sob controle das autoridades brasileiras. É o que aponta recente estudo do Instituto Sou da Paz que alerta sobre a necessidade de melhorias imediatas nas políticas de controle de armas.
Costumamos achar que a arma utilizada de maneira criminosa é o fuzil, a metralhadora, a arma que vem contrabandeada do exterior. Mas a arma que mais mata brasileiras e brasileiros é a arma comum, como o revolver 38, que costuma ser adquirida de forma legal e, depois, utilizada para o crime. O que acontece no Nordeste, região com 44% das mortes por violência armada no país, é um retrato disso.
Essa constatação é importante para desmistificar a percepção difundida de que as armas usadas em crimes seriam majoritariamente frutos do tráfico internacional de armas quando, na verdade, o mercado legal, ao sofrer desvios, contribui para abastecer o mercado ilegal.
A pesquisa inédita “De onde vêm as armas do crime apreendidas no Nordeste?” foi produzida pelo Instituto Sou da Paz a partir de dados obtidos via Lei de Acesso à Informação junto às Secretarias de Segurança Pública e/ou Defesa Social. As informações vão ao encontro dodiagnóstico realizado pelo Sou da Paz sobre as armas apreendidas na região sudeste.
(Acesse aqui o infográfico da pesquisa)
O número de mortes por armas de fogo no Nordeste cresceu 98% em dez anos, alcançando 18.217 registros em 2015, o que representa 44% do total nacional, apesar de abrigar cerca de 28% da população. Este e outros desafios impostos pela crise de segurança na região justificam a análise das armas que vitimam a população destes estados.
Afirma Ivan Marques, diretor-executivo do Instituto Sou da Paz.
A falta de transparência no acesso aos dados de todos os estados impossibilitou traçar um perfil de toda a região. Apenas Alagoas e Ceará apresentaram todos os dados solicitados para a produção do relatório, sendo que no caso do Ceará foi preciso recorrer a um relatório que se refere a um recorte temporal um pouco diferente. Os estados da Paraíba, Rio Grande do Norte, Piauí e Maranhão enviaram dados parciais. Já os estados da Bahia, Pernambuco e Sergipe não forneceram nenhum dado sobre o perfil das armas apreendidas pelas suas forças de segurança – apesar de os três estados terem registrado, juntos, 8.728 mortes por armas de fogo em 2015, 21% do total nacional, segundo o Datasus.
O fato de que três dos nove Estados não tenha conseguido produzir e enviar nenhuma informação sobre armas apreendidas ajuda explicar o porquê de a região estar em uma situação tão trágica de crescimento da violência armada.
Comenta Ivan Marques.
Principais destaques
O estudo verificou que o padrão geral da ampla maioria das armas apreendidas do crime nos estados que disponibilizaram informações é de cano curto (entre 57%, na Paraíba, e 99%, em Teresina*), como revólveres e pistolas, e que também predominam os calibres mais comuns em armas de uso permitido (entre 74%, no Ceará, e 96%, em Teresina). Já a apreensão de armas de maior poder de fogo representa apenas entre 0,7% (Teresina) e 2,2% (Ceará) do total apreendido em cada estado. Foram também apreendidas uma quantidade significativa de espingardas, muitas de fabricação artesanal. Estas armas, de uso típico em zonas rurais chegaram a somar 21% em Alagoas e 31% na Paraíba.
O relatório também reforça diagnósticos anteriores realizados pelo Instituto Sou da Paz, corroborando que as armas apreendidas são majoritariamente brasileiras. Entre 76% (na Paraíba) e 95% (no Piauí) das armas apreendidas é de fabricação nacional, reforçando a necessidade de investimento neste controle pelas nossas autoridades.
Essa constatação é importante para desmistificar a percepção difundida de que as armas usadas em crimes seriam majoritariamente frutos do tráfico internacional de armas quando, na verdade, o mercado legal, ao sofrer desvios, contribui para abastecer o mercado ilegal.
Diz Ivan.
O perfil das armas apreendidas no Nordeste não difere muito do identificado na região Sudeste em 2014, onde 70% das armas também eram curtas, 70% de calibre permitido e 61% de fabricação nacional.
É crucial que os estados e o governo federal cooperem entre si na troca de informações e invistam na análise constante da origem das armas apreendidas para que seus padrões possam ser rapidamente identificados e as fontes de fornecimento de armas para o crime possam ser reprimidas.
Diz Ivan.
As medidas necessárias para viabilizar este controle são apontadas há anos sem que a maioria delas tenha começado a sair do papel. Este investimento em ter análises de perfil permanentes e investigações estratégicas é especialmente importante no momento atual, em que diversos estados vivem períodos críticos de violência armada e dificuldades orçamentárias, sendo essencial otimizar recursos e correr contra o tempo para evitar que mais vidas sejam perdidas.
Conclui.
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*O estado do Piauí somente forneceu informações completas para as armas apreendidas em sua capital
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