Foto: facebook da deputada.
Fonte: Agência Brasil.
O Ministério Público de Santa Catarina vai investigar a conduta da deputada estadual eleita Ana Caroline Campagnolo, do PSL, partido de Bolsonaro, que divulgou nas redes sociais um comunicado pedindo que estudantes catarineneses gravem e denunciem professores que realizem “manifestações político-partidárias” contrárias ao presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL). Segundo a assessoria de imprensa do órgão, a 25ª Promotoria de Justiça de Florianópolis instaurou, via ofício, um procedimento para apurar violação ao direito à educação e adotar as medidas cabíveis.
“Segunda-feira, 29 de outubro, é o dia em que os professores e doutrinadores estarão inconformados e revoltados. Muitos deles não conterão sua ira e farão da sala de aula um auditório cativo para suas queixas político partidárias em virtude da vitória de Bolsonaro. Filme ou grave todas as manifestações político-partidárias ou ideológicas”, disse a deputada em suas redes sociais, ignorando seu próprio partidarismo e ideologia de extrema-direita, escancarados em suas declarações e atitudes.
Em nota, os sindicatos representantes dos trabalhadores em educação das redes pública e privada municipal, estadual e federal do Estado de Santa Catarina classificam o comunicado da deputada eleita como ameaça e ataque à liberdade de ensinar do professor. Segundo os sindicatos, isso “é tipicamente aplicado em regimes de autoritarismo e censura”.
“A sugestão de denúncia dos professores por estudantes caracteriza um assédio e uma perseguição em ambiente escolar, algo que remonta aos tempos da ditadura civil-militar brasileira”, diz a nota
Os sindicatos dizem ainda que os próprios sistemas de ensino têm autonomia para propor, em conjunto com toda a comunidade escolar, o currículo e demais atividades pedagógicas. “Atitudes de provocação interferem de forma ilegal e inconstitucional no processo democrático de organização escolar, extrapolando a competência de fiscalização do trabalho escolar e do acompanhamento das atividades profissionais feitas pelas equipes pedagógicas”.
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Escola sem Partido
Projetos de lei com conteúdos semelhantes tramitam tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado Federal. A proposta é incluir entre os princípios do ensino, o respeito às “convicções do aluno e de seus pais ou responsáveis”, dando precedência aos valores de ordem familiar sobre a educação escolar.
Os projetos são polêmicos, quando não inconstitucionais. Por um lado, os defensores dizem que professores e autores de materiais didáticos vêm se utilizando de suas aulas e de suas obras para tentar obter a adesão dos estudantes à determinadas “correntes políticas e ideológicas”. Já os críticos dizem que as leis atuais já impedem qualquer tipo de abuso por parte dos professores e que um projeto como o Escola sem Partido vai gerar insegurança nas salas de aulas e perseguição aos professores.
Muitos professores e especialistas em educação acreditam que esses projetos de censura desprezam a formação e o trabalho do professor, equiparando fatos históricos e dados resultantes de décadas, as vezes séculos, de pesquisas científicas a “meras opiniões” ou a “ideologias partidárias”. Casos de famílias que reclamaram do conteúdo ensinado em aula com base no projeto Escola Sem Partido incluem “denúncias” a professores que discutiram em sala religiões de matriz africana existentes e professadas no país hoje, e episódios críticos da história do Brasil como a escravidão ou a ditadura militar.
Ainda, esses projetos ignoram ou omitem que toda escolha de inclusão ou exclusão de conteúdo é em si uma opção ideológica, o que significa que a própria idéia de “neutralidade” proposta é um tipo de ideologia.
Especialistas apontam que em várias experiências semelhantes ocorridas nos Estados Unidos, a neutralidade exigida aos professores não foi traduzida em uma neutralidade no ensino em si, mas os estudantes com opiniões mais fortes prevaleciam com relação à opinião dos mais fracos, não eliminando a doutrinação.
Ameaças
Segundo o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN), em todo o país, professores têm sofrido ameaças. A orientação do sindicato é que os docentes que passarem por situação de constrangimento e ameaças mantenham a tranquilidade e reúnam o máximo de evidências e provas das situações, que inclusive façam “prints”, ou seja, copiem os conteúdos caso as ameaças tenham sido feitas por meio de redes sociais. Os professores devem procurar a seção sindical local para que as medidas cabíveis sejam tomadas.
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Anistia Internacional
Em nota, a Anistia Internacional diz que crescem no Brasil os relatos de professores em escolas e em universidades que têm sofrido pressões indevidas, coerções e intimidações. “Tentar impedir o debate saudável e necessário de ideias e conteúdos em sala de aula, inclusive através da proibição de autores consagrados e temas fundamentais para o pleno desenvolvimento humano, é uma violação do direito à educação e à liberdade de expressão”, diz.
Segundo a entidade, as autoridades brasileiras devem atuar imediatamente para proteger o direito de professores e alunos em escolas e universidades e o pleno exercício do direito à liberdade de expressão e do direito à educação.
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